116 páginas – 1ª edição – 2010
Nação, como disse o filósofo e crítico catalão Eugênio D’Ors (1881-1954), é uma entidade de cultura. Durante mais de quatro séculos, atravessando conflitos e períodos difíceis da história da Península Ibérica, a Catalunha perdeu e recuperou diversas vezes o direito ao uso de seu idioma, sua identidade máxima. Três anos após a morte do ditador espanhol Francisco Franco (1892-1975), a Catalunha ganhou novamente sua autonomia e sua língua, e hoje é o principal destino turístico da Espanha. E a terra de Antoni Gaudí, Salvador Dali, Pau Casals, Joan Miró, Josep Carreras e Carles Puyol produziu, igualmente, uma grande quantidade de excelente poetas, dos quais, talvez, Joan Brossa seja o mais importante nome da atualidade.
Maestro e violinista radicado em Florianópolis desde 1985, Luis Soler Realp, aos 90 anos, lança agora pela Editora da UFSC a sua tradução de 4 poetas da Catalunha, organizando e apresentando obras de quatro personagens que moldaram a poética catalã desde o final do século 19: o primeiro “moderno” Joan Maragall (1860-1911), o pós-simbolista e metafísico Carles Riba (1893-1959), o engajado Pere Quart, pseudônimo de Joan Oliver (1899-1986) e o satírico-existencialista Salvador Espriu (1913-1985).
Luis Soler Realp nasceu em Barcelona, no dia 3 de maio de 1920, e começou a estudar violino aos sete anos, tendo como professores importantes violinistas e compositores catalães como Eduard Toldrá, Mariano Perelló e Joan Massiá. Porém, a música cederia lugar em sua vida à medicina, durante um breve período, em circunstâncias bastantes difíceis.
Convocado para lutar na Guerra Civil Espanhola, ao lado dos republicanos, poucos meses antes de completar 18 anos, Soler fez um curso de enfermagem e, também, já estudante de medicina, acabou tornando-se o médico principal de um batalhão de 5 mil homens na frente de combate de Lérida. Seu irmão mais velho, o poeta Miguel Soler Realp, morreu na guerra. Terminado o conflito, em 1939, conseguiu escapar dos campos de concentração franquistas refugiando-se na Ilha de Menorca e retomou os estudos, em 1941, ao retornar a Barcelona. A medicina, porém, logo seria abandonada em definitivo em favor da música, sua verdadeira vocação.
Sua primeira apresentação pública como concertista aconteceu em 1944, e logo ele estaria tocando, também, fora da Espanha, em Portugal, Itália e Alemanha Ocidental. Paralelamente à música, começou a publicar seus poemas em catalão (os dois primeiros livros, Poemes e Baladas i cançons, saíram em 1946 e 1947, respectivamente), participando da resistência à repressão cultural e lingüística promovida por Francisco Franco. Perseguido após ter publicado textos e poemas em jornais antifranquistas, veio para a América do Sul no começo da década de 1950, primeiro para o Uruguai, onde foi primeiro violino e participou da criação da Orquestra Filarmônica de Montevidéu.
No Brasil, Soler chegaria em 1960, para ensinar violino e ser regente de Música de Câmara na Escola de Belas Artes na Universidade Federal de Pernambuco. Sobre o seu trabalho no Recife, vale registrar o depoimento do músico Antonio Nóbrega à revista do Instituto de Estudos Avançados da USP. “Durante muito tempo estudei violino e tive a sorte de ter um grande professor, um catalão chamado Luis Soler, um homem muito austero no ensino do violino. Hoje, agradeço ao rigor e à disciplina desse professor, porque elas estão na base dos meus conhecimentos musicais”.
Ao se aposentar, Luis Soler recebeu o convite para lecionar na Udesc por parte de um amigo catarinense, o maestro Edino Krieger, então diretor do Instituto Nacional da Música e seu colega no Projeto Espiral desenvolvido pela Funarte, nos anos 1970 e 1980, para o ensino dos instrumentos de cordas a jovens carentes. E o maestro catalão, que nunca se acostumou com o calor do Recife, de pronto trocou o Nordeste pelo clima mais ameno do Sul do país e adotou Florianópolis como lar em 1985. Luis Soler lecionou música na Udesc (Universidade do Estado de Santa Catarina) até 1990, quando sofreu um derrame e teve que se aposentar definitivamente. No Brasil, Soler publicou os livros Um olhar, dois tempos (poesia, José Oympio Editora, 1985), Origens árabes no folclore do sertão brasileiro (ensaio, Editora da UFSC, 1995) e Búzios de aquário (poesia, Editora da UFSC, 1999).